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O centenário do
eterno Rei do Baião


Se estivesse vivo, Luiz Gonzaga completaria 100 anos em 2012, porém até hoje seu legado é imenso para a música brasileira

(11/10/2012)

"Quero ser lembrado como o sanfoneiro que amou e cantou muito seu povo, o sertão; que cantou as aves, os animais, os padres, os cangaceiros, os retirantes, os valentes, os covardes, o amor." Esse foi Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, considerado por muitos um santo, símbolo da resistência do Nordeste e de sua gente sofrida e trabalhadora. É um dos artistas mais populares do país. Sua obra o transformou numa das melhores sínteses do pensamento cultural nordestino. Falecido em 02 de agosto de 1989, ele completaria 100 anos em 2012. Sua morte deixou para atrás um legado monumental, talvez o maior de toda a música brasileira do século passado.  O filme "Gonzaga - de Pai pra Filho", de Breno Silveira, que estréia em outubro, é apenas uma das muitas homenagens que devemos prestar a esse grande astro.

Nenhum artista brasileiro foi tão importante para a cultura das regiões Nordeste e Norte do Brasil quanto Luiz Gonzaga do Nascimento, filho do mestre sanfoneiro Januário e da roceira Ana Batista de Jesus, que um dia saiu da pequena cidade de Exu, região do Araripe, no sertão pernambucano, para conquistar o Brasil e fazer sua sanfona conhecida nos quatro cantos do país e até no exterior. Nascido em 13 de dezembro de 1912, Luiz Gonzaga, conhecido também como “Gonzagão” ou “Velho Lua”, foi um artista completo da música popular brasileira. Cantor, compositor, sanfoneiro, criou dezenas de canções de sucesso, que nunca foram esquecidas ao longo do tempo, como Asa Branca, Assum Preto, Baião, realizadas em parceria com Humberto Teixeira, A Dança da Moda, Cintura Fina, ambas criadas com Zé Dantas, Juazeiro e tantas outras produções que marcaram a sua carreira.

Além da sanfona, a zabumba, o triângulo e as vestes de cangaceiro também foram características do trabalho de Luiz Gonzaga, que por onde se apresentava, levava a alegria de suas músicas, que tanto ajudaram a difundir, pelo restante do país, os sons musicais do Nordeste e a realidade de toda a região. De sanfona em punho, Gonzagão percorreu o Brasil inteiro e semeou por este imenso chão seu canto de fé e de esperança. Seu destino foi andar por este país afora e encantar o povo com sua música entranhada nas raízes do Brasil. Os anos 1980 marcaram a retomada do reconhecimento nacional da importância cultural e social do canto de Luiz Gonzaga. A turnê “A Vida do Viajante”, ao lado de Gonzaguinha, por exemplo, resgatou o prestígio do Rei do Baião e reafirmou sua contribuição como mestre da canção popular brasileira. Só pra ter idéia, a música de Gonzagão tem para o povo do Norte e do Nordeste do Brasil a importância como a fé no Padre Cícero Romão. E já subiu ao posto mais alto do pódio onde também merecem medalhas o xaxado de Jackson do Pandeiro, a arte de barro do mestre Vitalino, a poesia de Patativa do Assaré e de Azulão e a sabedoria moleque de Ariano Suassuna.

No decorrer destes vários anos, o Velho Lua teve a ousadia necessária para assumir a nordestinidade representada pela a sanfona e pelo chapéu de couro. Cantou as dores e os amores de um povo que ainda não tinha voz. Sua trajetória é um símbolo de persistência, obstinação, talento e força criativa popular. Foi Luiz Gonzaga, junto com seus poetas como Zé Dantas, Patativa do Assaré e Humberto Teixeira, que divulgaram o sertão nordestino que está no imaginário do povo brasileiro. Claro que pintores como Portinari, poetas como João Cabral de Melo Neto, romancistas como Graciliano Ramos, dramaturgos como Ariano Suassuna se somaram nessa divulgação, mas como uma crítica à crueldade da fome e da sede que pairavam sobre o semiárido.

O Brasil perdeu um ícone da música popular, mas ganhou um mito que viverá para sempre em suas canções, pois o homem simples soube cantar a simplicidade do sofrido povo brasileiro e chegou a conquistar a todos, independente da classe social. Ele continua onipresente, como atesta o sucesso de seus baiões, xotes e xaxados nas festas juninas pelo país afora. Sua música continua viva por ser uma obra prima da cultura popular, mas a nossa realidade mudou. Há muito por caminhar, mas grande parte do caminho foi feito. Gonzaga gostaria de ver a volta de grande parte dos migrantes nordestinos para o Nordeste. Sem perdermos nossas raízes culturais, principalmente a musical, hoje já podemos fazer novos baiões, novos xotes, novos rastapés, um novo forró, para a alegria nordestina que nunca morre. Nesses cem anos de nascimento de Luiz Gonzaga, o eterno Rei do Baião vai fazer a festa no céu, enquanto nós a faremos aqui na Terra, até o dia que Deus permitir.


Marcus Vinicius Jacobson

Jornalista e diretor do MVHP - Portal de Cifras
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